Publicidade

Exercícios sobre Clarice Lispector.

Exercícios de literatura sobre Clarice Lispector. Escritora clássica da literatura brasileira acompanhe as questões sobre interpretação dos textos da autora. Sugeridos para aulas do ensino médio, vestibular e ENEM.

Exercícios sobre Clarice Lispector


Texto 1 (Pref. Francisco Dumont/MG COTEC/UNIMONTES - 2016) Leia o fragmento do conto “Amor”, de Clarice Lispector, retirado do livro Laços de família, para responder às questões a seguir. 

Um pouco cansada, com as compras deformando o novo saco de tricô, Ana subiu no bonde. Depositou o volume no colo e o bonde começou a andar. Recostou-se então no banco procurando conforto, num suspiro de meia satisfação. Os filhos de Ana eram bons, uma coisa verdadeira e sumarenta. Cresciam, tomavam banho, exigiam para si, malcriados, instantes cada vez mais completos. A cozinha era enfim espaçosa, o fogão enguiçado dava estouros. O calor era forte no apartamento que estavam aos poucos pagando. Mas o vento batendo nas cortinas que ela mesma cortara lembrava-lhe que se quisesse podia parar e enxugar a testa, olhando o calmo horizonte. Ana dava a tudo, tranquilamente, sua mão pequena e forte, sua corrente de vida. [...] No fundo, Ana sempre tivera necessidade de sentir a raiz firme das coisas. E isso um lar perplexamente lhe dera. Por caminhos tortos, viera a cair num destino de mulher, com a surpresa de nele caber como se o tivesse inventado. O homem com quem casara era um homem verdadeiro, os filhos que tivera eram filhos verdadeiros. Sua juventude anterior parecia-lhe estranha como uma doença de vida. Dela havia aos poucos emergido para descobrir que também sem a felicidade se vivia: abolindo-a, encontrara uma legião de pessoas, antes invisíveis, que viviam como quem trabalha — com persistência, continuidade, alegria. [...] O bonde se arrastava, em seguida estacava. Foi então que olhou para o homem parado no ponto. A diferença entre ele e os outros é que ele estava realmente parado. De pé, suas mãos se mantinham avançadas. Era um cego. O que havia mais que fizesse Ana se aprumar em desconfiança? Alguma coisa intranquila estava sucedendo. Então ela viu: o cego mascava chicles... Um homem cego mascava chicles. [...] Ele mascava goma na escuridão. Sem sofrimento, com os olhos abertos. O movimento da mastigação fazia-o parecer sorrir e de repente deixar de sorrir, sorrir e deixar de sorrir — como se ele a tivesse insultado, Ana olhava-o. E quem a visse teria a impressão de uma mulher com ódio. Mas continuava a olhá-lo, cada vez mais inclinada — o bonde deu uma arrancada súbita jogando-a desprevenida para trás, o pesado saco de tricô despencou-se do colo, ruiu no chão — Ana deu um grito, o condutor deu ordem de parada antes de saber do que se tratava — o bonde estacou, os passageiros olharam assustados. Incapaz de se mover para apanhar suas compras, Ana se aprumava pálida. Uma expressão de rosto, há muito não usada, ressurgia-lhe com dificuldade, ainda incerta, incompreensível. O moleque dos jornais ria entregando-lhe o volume. Mas os ovos se haviam quebrado no embrulho de jornal. Gemas amarelas e viscosas pingavam entre os fios da rede. O cego interrompera a mastigação e avançava as mãos inseguras, tentando inutilmente pegar o que acontecia. O embrulho dos ovos foi jogado fora da rede e, entre os sorrisos dos passageiros e o sinal do condutor, o bonde deu a nova arrancada de partida. Poucos instantes depois já não a olhavam mais. O bonde se sacudia nos trilhos e o cego mascando goma ficara atrás para sempre. Mas o mal estava feito. A rede de tricô era áspera entre os dedos, não íntima como quando a tricotara. A rede perdera o sentido e estar num bonde era um fio partido; não sabia o que fazer com as compras no colo. E como uma estranha música, o mundo recomeçava ao redor. O mal estava feito. Por quê? Teria esquecido de que havia cegos? A piedade a sufocava, Ana respirava pesadamente. Mesmo as coisas que existiam antes do acontecimento estavam agora de sobreaviso, tinham um ar mais hostil, perecível... O mundo se tornara de novo um malestar. [...] Só então percebeu que há muito passara do seu ponto de descida. Na fraqueza em que estava, tudo a atingia com um susto; desceu do bonde com pernas débeis, olhou em torno de si, segurando a rede suja de ovo. Por um momento não conseguia orientar-se. Parecia ter saltado no meio da noite. [...] Andava pesadamente pela alameda central, entre os coqueiros. Não havia ninguém no Jardim. Depositou os embrulhos na terra, sentou-se no banco de um atalho e ali ficou muito tempo. A vastidão parecia acalmá-la, o silêncio regulava sua respiração. Ela adormecia dentro de si. [...] Mas quando se lembrou das crianças, diante das quais se tornara culpada, ergueu-se com uma exclamação de dor. Agarrou o embrulho, avançou pelo atalho obscuro, atingiu a alameda. Quase corria — e via o Jardim em torno de si, com sua impersonalidade soberba. Sacudiu os portões fechados, sacudia-os segurando a madeira áspera. O vigia apareceu espantado de não a ter visto. Correu com a rede até o elevador, sua alma batia-lhe no peito — o que sucedia? A piedade pelo cego era tão violenta como uma ânsia, mas o mundo lhe parecia seu, sujo, perecível, seu. Abriu a porta de casa. A sala era grande, quadrada, as maçanetas brilhavam limpas, os vidros da janela brilhavam, a lâmpada brilhava — que nova terra era essa? E por um instante a vida sadia que levara até agora pareceu-lhe um modo moralmente louco de viver. O menino que se aproximou correndo era um ser de pernas compridas e rosto igual ao seu, que corria e a abraçava. Apertou-o com força, com espanto. Ela amava o mundo, amava o que fora criado — amava com nojo. Abraçou o filho, quase a ponto de machucá-lo. [...] Não havia como fugir. Os dias que ela forjara haviam-se rompido na crosta e a água escapava. Estava diante da ostra. E não havia como não olhá-la. De que tinha vergonha? É que já não era mais piedade, não era só piedade: seu coração se enchera com a pior vontade de viver.

Responda as questões com base no texto 1

1) Assinale a alternativa INCORRETA.

  • A)A narrativa demonstra que a personagem Ana vê-se subitamente despertada pelo amor ao cego, único ser capaz de retirá-la da alienação da vida comum de dona de casa.
  • B) O conto representa um momento da vida de uma mãe e dona de casa, que suspende momentaneamente suas atividades cotidianas para viver uma possível metafísica do instante.
  • C) A imagem da rede de ovos que se parte e deixa escorrer a gema amarela metaforiza o despertar, ainda que passageiro, de uma mulher comum, que passa a ter uma visão mais consciente de seu papel social.
  • D)A epifania, característica comum na narrativa de Clarice Lispector, acontece quando a personagem vê o cego parado, mascando chicles, pois é a partir daí que ela começa a ter noção de si.


2) O conto “Amor”, de Clarice Lispector, possui todas as características apresentadas abaixo, EXCETO

  • A)O narrador afasta-se totalmente da personagem e da cena, deixando prevalecer a observação distanciada e a análise objetiva dos fatos relatados.
  • B) O olhar minucioso, a descrição atenta e a demonstração dos complexos sentimentos da personagem revelam relativa proximidade do narrador com os acontecimentos.
  • C) A personagem Ana identifica-se com as mulheres comuns de sua classe e situação, no entanto, ela vive um momento único de revelação e consciência, que pode ser traduzido como uma vontade inconsciente de libertação.
  • D)O cotidiano, a cena corriqueira e a personagem comum são artifícios usados pela autora para refletir sobre a vida, os papéis sociais e seus significados.
Publicidade

3) Sobre o texto de Clarice Lispector, é INCORRETO afirmar:

  • A)Trata-se de um conto, porque condensa personagens e ações, apresentando um conflito central.
  • B) A narrativa apresenta fluxo de consciência, pois as emoções da personagem fundem-se às reflexões da voz narrativa, dando maior ênfase ao mundo interior.
  • C) Trata-se de um conto, porque apresenta linguagem acessível e tema popular, adequando-se às exigências de um leitor contemporâneo.
  • D)As emoções da personagem, com suas contradições e descobertas, expressam a súbita consciência sobre sua vida e sua identidade.


4) Sobre o título “Amor” do conto de Clarice Lispector, está INCORRETA a alternativa:

  • A)A autora apresenta uma visão desmistificadora e reflexiva sobre o amor, contrariando uma percepção romantizada e lírica do sentimento.
  • B) No texto, evidencia-se que o amor é um sentimento que pode ser despertado por contingências cotidianas, incorporando-se aos fatos corriqueiros da vida.
  • C) A consciência subitamente despertada na personagem propicia a ela uma experiência invulgar de reflexão, em que o amor se incorpora de forma complexa e ambígua.
  • D)O título representa uma ironia da autora sobre o sentimento amoroso, pois a personagem conclui que sua vida é monótona e sem sentido. 


5) Assinale a alternativa que apresenta a relação INCORRETA entre o excerto e o que ele expressa.

  • A) “Incapaz de se mover para apanhar suas compras, Ana se aprumava pálida. Uma expressão de rosto, há muito não usada, ressurgia-lhe com dificuldade, ainda incerta, incompreensível. O moleque dos jornais ria entregando-lhe o volume. Mas os ovos se haviam quebrado no embrulho de jornal. Gemas amarelas e viscosas pingavam entre os fios da rede.” — O trecho destaca o momento de revelação e autodescoberta vivenciado por Ana.
  • B) “Os filhos de Ana eram bons, uma coisa verdadeira e sumarenta. Cresciam, tomavam banho, exigiam para si, malcriados, instantes cada vez mais completos. A cozinha era enfim espaçosa, o fogão enguiçado dava estouros. O calor era forte no apartamento que estavam aos poucos pagando. Mas o vento batendo nas cortinas que ela mesma cortara lembrava-lhe que se quisesse podia parar e enxugar a testa, olhando o calmo horizonte. Ana dava a tudo, tranquilamente, sua mão pequena e forte, sua corrente de vida.” — O
  • trecho expressa o vazio existencial da personagem.
  • C) “A rede de tricô era áspera entre os dedos, não íntima como quando a tricotara. A rede perdera o sentido e estar num bonde era um fio partido; não sabia o que fazer com as compras no colo. E como uma estranha música, o mundo recomeçava ao redor. O mal estava feito.” — O trecho evidencia, metaforicamente, uma necessidade de libertação da personagem.
  • D) “Abriu a porta de casa. A sala era grande, quadrada, as maçanetas brilhavam limpas, os vidros da janela brilhavam, a lâmpada brilhava — que nova terra era essa? E por um instante a vida sadia que levara até agora pareceu-lhe um modo moralmente louco de viver. O menino que se aproximou correndo era um ser de pernas compridas e rosto igual ao seu, que corria e a abraçava. Apertou-o com força, com espanto.” — O trecho evidencia que a experiência vivida pela personagem desperta nova consciência sobre o que está a seu entorno.

Gabarito das questões do Texto 1

1A 2A 3C 4D 5B


Exercícios sobre Clarice Lispector.





Texto 2 (IFMT-2012)

Com esta história eu vou me sensibilizar, e bem sei que cada dia é um dia roubado da morte. Eu não sou um intelectual, escrevo com o corpo. E o que escrevo é uma névoa úmida. As palavras são sons transfundidos de sombras que se entrecruzam desiguais, estalactites, renda, música transfigurada de órgão. Mal ouso clamar palavras a essa rede vibrante e rica, mórbida e obscura tendo como contra tom o baixo grosso da dor. Alegro com brio. Tentarei tirar ouro do carvão.
Sei que estou adiando a história e que brinco de bola sem bola. O fato é um ato? Juro que este livro é feito sem palavras.
É uma fotografia muda. Este livro é um silêncio. Este livro é uma pergunta.
É. Parece que estou mudando o modo de escrever. Mas acontece que só escrevo o que quero, não sou um profissional – e preciso falar dessa nordestina senão sufoco. Ela me acusa e o meio de me defender é escrever sobre ela. Escrevo em traços vivos e ríspidos de pintura. Estarei lidando com fatos como se fossem as irremediáveis pedras de que falei.
Embora queira que para me animar sinos badalem enquanto adivinho a realidade. E que anjos esvoacem em vespas transparentes em torno de minha cabeça quente porque esta quer se transformar em objeto-coisa, é mais fácil.
(LISPECTOR, Clarice. A hora da estrela. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2004.)

1) Que questão o narrador clariceano NÃO coloca ao leitor como ponto de sua reflexão/escrita?
  • [A] O papel do escritor e sua função na sociedade.
  • x[B] Sua escrita em resposta às cobranças da crítica literária.
  • [C] A aproximação entre as artes de diferentes linguagens.
  • [D] O processo de depuração da escrita.


2) Em sua reflexão metalinguística, de que estratégia discursiva se utiliza o narrador?
  • [A] Afirma com insistência que a sua escrita efetivamente imprime mudanças na sociedade.
  • [B] Ignora a figura do leitor, que fica fora do alcance das suas indagações.
  • [C] O narrador silencia, mostrando que considera Macabea capaz de falar por si própria.
  • x[D] Coloca sua narração sob suspeição, ao optar por expor igualmente os mecanismos constitutivos da narrativa e da  narração.


3) No conjunto da obra de Clarice Lispector, têm centralidade as personagens femininas. No caso de A hora da estrela, pode-se dizer que Macabea revela
  • [A] a origem de sua força em sua psicologia e existência interiores.
  • [B] uma atuação e destino marcados pela comicidade.
  • x[C] seu lugar como personagem e sua atuação determinados por um jogo de forças familiares e sociais.
  • [D] seu papel de heroína paradigmática – a sertaneja que consegue escapar à tragédia do sertão.





Adquira o Livro Português Esquematizado Gramática, Interpretação de Texto, Redação Oficial e Redação Discursiva. O candidato tem diante de si todo o arsenal de Língua Portuguesa. Clique aqui e confira!



Compartilhe Compartilhe Compartilhe
Compartilhe em sua s Redes Sociais!


0 comentários:

Tecnologia do Blogger.
 
Sobre | Termos de Uso | Política de Cookies | Política de Privacidade

João 3 16 Porque Deus amou o mundo de tal maneira que deu o seu Filho Unigênito, para que todo aquele que nele crê não pereça, mas tenha a vida eterna.